Só alguns poucos das gerações mais experientes no Brasil sabem o
significado da conquista das Diretas, no movimento realizado no fim
da ditadura militar e culminado em 1984, com a posterior eleição do
presidente Tancredo Neves, falecido a 21 de abril e substituído pelo
vice-presidente, José Ribamar Ferreira de Araújo Costa (José
Sarney), “pai” dos planos econômicos que fariam do Brasil um
novo país e trouxeram a inflação galopante a estas terras
dalém-mar. Alguém se lembra dos quase 80% de inflação mensal no
momento mais crítico daquela época?
Nos primórdios da reconquista da democracia e do direito do povo a
eleger seus governantes, a grande ânsia do povo era acabar com a má
distribuição de renda. Tanto que o principal motivo de campanha do
primeiro presidente eleito pelo povo depois da ditadura militar era a
“caça aos marajás”. Ele promoveria, na presidência, uma caça
àqueles que recebiam salários exorbitantes, promovendo uma
redistribuição de renda. O povo sonhou, o povo o elegeu, pensando
que agora, depois da ditadura e da inflação absurda, o país
entraria numa fase boa. E Fernando Collor de Melo confiscou o
dinheiro investido do povo e, depois, foi caçado por motivos de
corrupção, justo o que ele mais disse que iria combater, a pedido
do próprio povo nas ruas, substituído então pelo seu
vice-presidente, Itamar Franco.
Voltamos então a um presidente não eleito diretamente pelo povo (o
eleito era o Fernando Collor, mas Itamar, seu vice, assumiu no meio
do mandato) que convidou Fernando Henrique Cardoso para seu ministro,
o qual instituiu o plano Real. Quem se lembra da URV, no processo de
transição para a nova moeda? Antigamente, quando passamos do
Cruzeiro para o Cruzado, Cruzado Novo era só cortar 3 zeros que a
conta continuava. Mas na época da URV, cada unidade valia 2.750,00
Cruzados Novos. A conta era difícil de fazer. Muitos se confundiam.
Por alguns meses, vivemos esse processo duplo, de uma moeda e uma
intermediária nas mãos, até a implantação definitiva do Real
(R$), numa alusão à antiga moeda tão falada até hoje quando, nos
meios populares, queremos nos referir a alguns trocados (réis).
Então, com a inflação controlada, sob a bandeira do Plano Real, o
Ministro Fernando Henrique candidatou-se a presidente. E ganhou. 1 e
2 vezes. Tivemos 8 anos de governo eleito pelo povo, sem interrupção
para que um vice viesse a assumir. O grande fantasma (ou dragão) da
inflação foi embora (pelo menos aquela de 40%, 80% ao mês) e
voltamos a acreditar. Mas, como todo remédio tem seu efeito
colateral, veio a recessão pois, para manter as taxas inflacionárias
baixas, é necessário manter um rígido controle no consumo e, como
num efeito em cascata, isto diminuiu o consumo, a produção, o
crescimento e, finalmente, o emprego.
E, neste novo cenário, o povo resolveu escolher alguém que pudesse
(como pensava-se) resolver o problema da falta de emprego. O sempre
candidato do Partido dos Trabalhadores, Luís Inácio, o Lula, depois
de tantas tentativas, agora se elegia para fazer a distribuição de
renda e para trazer o emprego. Esse problema foi resolvido. O bolsa
família ganhou um gás. Mas como todo remédio pode causar um efeito
colateral, mais uma vez, a solução trouxe seus problemas junto. Um
populismo mantido às custas de muito dinheiro desviado e mau usado,
uma estrutura governamental mantida à base de muita corrupção e um
projeto de governo que se não o foi desde o início, tornou-se
egocêntrico e megalomaníaco, sem a mínima preocupação com o
Brasil, mas apenas consigo mesmo.
Logo em seguida, a primeira presidente mulher, Dilma Roussef, que
nunca havia sido eleita nem vereadora, tornou-se em seu primeiro
cargo eletivo, a maior autoridade do Brasil, levada a esta posição
pelo altíssimo grau de popularidade do presidente anterior, seu
padrinho Lula. Depois de cumprir o primeiro mandato, em seu segundo
vimos um presidente ser retirado pelo processo de impeachment. E
novamente, depois de tanto tempo, o vice assumiu, Michel Temer, num
período onde irromperam as maiores denúncias de corrupção já
ouvidas no Brasil.
O que ganhamos com tudo isso? Bem, primeiro uma experiência incrível
em passar por tantas crises e mudanças. Temos o sistema bancário
informatizado mais avançado do mundo “graças” ao tempo da
inflação. Temos aprendido a usar o dinheiro e, agora, a buscarmos
alternativas de renda quando o emprego falta. Estamos, aos poucos,
aprendendo a ser povo e lutar pelos nossos direitos e interesses.
Estamos na época das redes sociais, que permitem uma comunicação e
mobilização como nunca antes. Estamos vendo na prática grandes
nomes da economia e política irem para a prisão, algo impensado no
Brasil até pouco tempo atrás. Milionários, senadores e
ex-presidentes estão presos! Temos dado mais atenção aos 11
ministros do STF (e agora o povo até sabe o que significa “STF”!)
do que aos 11 convocados titulares para a seleção que vai jogar a
copa do mundo este ano na Rússia.
Mas, isso tudo não teria valor se não aprendêssemos dessa história
toda a como votar. Como eleger nossos representantes. Como agir com
eles depois de eleitos. Vamos aprender história. De verdade. Aquela
história que nos leva a refletir e consertar nossos próprios erros.
Vamos votar consciente e com maturidade. Precisamos ainda vencer a má
distribuição de renda, a corrupção, a injustiça social, o
coronelismo. Não está tudo resolvido. O gigante está acordando e
se espreguiçando. Ainda não escovou os dentes ou penteou o cabelo
para sair de casa.
Esta é uma longa caminhada. Mas depende muito mais de nós do que
deles.
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