Alguns dizem que a vida começa aos 40. Eu achei que não era bem
assim. Hoje espero que seja. Recomeços são minha especialidade. E
em cada um deles, trazendo para o novo começo as experiências dos
anteriores. Meio como o Matrix, no episódio 3.
E olha que eu aprendi heim. Se tem uma coisa da qual não me
arrependo é de ter buscado o aprendizado e o conhecimento todo esse
tempo. Mas sempre soube (e corri o risco) que os melhores
aprendizados são obtidos pelos erros. São inevitáveis. Mas muitos
não tiram proveito deles. Eu fico feliz de não ter desperdiçado
meus erros. Aliás, procurei aprender também com os erros dos
outros. Isso é útil. Economiza muito tempo.
Agora espero estar pronto para começar.
Pra trás ficam muitas histórias (e vivências). Mantenho as
experiências que me deram. A bíblia, sobre isso, diz: “retem o
que é bom”. Tudo o que eu já vivi até hoje ajudou a definir quem
eu sou. Em quem me tornarei daqui pra frente.
Mas que realmente é meio “mágico” essa coisa de parar para
pensar no “resto da vida” quando se faz 40, isso é.
Tem uma estória que se conta, sobre a águia, dizendo que ela,
quando chega aos 40 anos (nesta estória, ela vive até os 70!), está
cansada, com excesso de penas pelo corpo, com unhas tão grandes e
curvadas que não servem mais para caçar, com o bico gasto. De
acordo com esta estória, aos 40 anos de idade, a água se retira
para um rochedo bem alto, se isola por um período ali e “decide”
se deseja renovar seu corpo para o restante de sua vida. Sem essa
renovação, sem as garras para caçar ou o bico apropriado, ela
seria presa fácil a qualquer momento. Mas então, ela “decide”
se isolar. Daí, arranca as próprias penas (em excesso) com suas
garras. Depois ela tira as próprias garras com o bico. Depois de
toda essa automutilação, ela ainda escolhe um pedaço de rocha bem
forte e começa a bater o bico, até quebrar. De acordo com a
estória, depois de tudo isso, começam a nascer tudo de novo. As
penas, as garras e o bico. Tudo novo. Renovado e fortalecido. Esse
período foi árduo. Difícil. Longo. Mas agora vale a pena. Então
ela sai de novo em busca de sua nova vida e tem mais 30 anos à
frente.
Talvez essa estória não seja “zoologicamente” verdadeira. Mas
vale a metáfora para quando fazemos 40 anos. Há alguns poucos (2 ou
3) anos atrás, comecei a tirar as penas, as garras e o bico. Estou
no momento de aguardar que cresçam novamente. Estou renovando. É
muito bom. Chego a ter pena de tantos quantos apenas seguem a vida,
sem nunca pararem para fazerem uma reflexão geral.
Li dia desses um poema do Mário quintana intitulado
“o tempo”.
A
vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando
se vê, já são seis horas!
Quando
de vê, já é sexta-feira!
Quando
se vê, já é natal...
Quando
se vê, já terminou o ano...
Quando
se vê perdemos o amor da nossa vida.
Quando
se vê passaram 50 anos!
Agora
é tarde demais para ser reprovado...
Se
me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria
sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil
das horas...
O tempo passa mesmo. Não espera
ninguém. Não me esperou. Cheguei nos 40 e aqui estou. Essa
impressão da correria do tempo está, parece-me, cada vez mais
nítida. E, nesse tempo todo, não fiz tudo o que queria, não
consegui tudo o que planejei. Mas quando planejamos um monte de
coisas, no afã de viver intensamente, esquecemos que no meio do
caminho surgirão obstáculos e muitos planos que esperávamos
resolver 1 ou 2 anos, acabam tomando 10 ou 20… fácil, fácil.
Por isso, não fiz tudo o que
queria, mas no meio desses obstáculos, aprendi muita coisa.
Redirecionei planos. Desisti de alguns que se tornaram obsoletos. Ou
intensifiquei e mergulhei em outros que pensava serem mais
superficiais e corriqueiros. Não eram. O verdadeiro aprendizado
estava, muitas vezes, nestes planos que no início eu julgava serem
corriqueiros.
Mas uma coisa eu agradeço: Soube
aproveitar cada experiência. Não desperdicei nenhuma. Nem as boas,
nem as ruins, nem as péssimas. Nem as construtivas, nem as
destrutivas, sobre as quais eu tive oportunidade de reconstruir novos
planos. Não desperdicei nada.
Não tenho aquela sensação e
aquela pergunta que muitos fazem “ah, o que eu fiz da minha vida
até aqui?” que para muitos ficam sem resposta. Tanto que, no atual
momento, o que mais estou aproveitando, é o tempo para um descanso e
para esta reflexão.
Uma das coisas bem práticas que
eu fiz, neste período em que estou completando 40 anos foi atualizar
meu currículo. Eu trabalho por conta há mais de 20 anos. Não uso
currículo desde então e, portanto, não o mantive atualizado. Mas
foi bom atualizar ele agora e ver o quanto pude realizar neste tempo.
Esta revisão de atividades profissionais me mostrou o quanto eu
aproveitei e utilizei o tempo nestes 40 anos. Ou nestes últimos 20.
Também estou revendo minha história, não apenas profissionalmente.
Estou colocando no papel. Que bom poder rever e ver os erros e
acertos, o crescimento, a evolução. Que bom poder olhar para trás
e perceber que “não foi em vão”, como a Bíblia promete.
Tem um filme, com Jack Nicholson,
“As Confissões de Schimidt” que eu assisti e o mesmo vale pelos
últimos 5 minutos de filme. Imagino que teve muita gente que começou
a assistir esse filme e desistiu com 20 ou 30 minutos. O filme é
parado. Não tem nada, até o final. No fim, o protagonista faz uma
reflexão sobre a sua própria trajetória de vida e conclui “quando
eu morrer, e quando todos os que me conheceram morrerem, será como
se eu nunca tivesse existido”. Ele chega à conclusão que não
deixou nada, neste mundo, para a posteridade. Não construiu um
legado. Não tem pelo que ser lembrado. E começa a procurar um
sentido, algo pelo qual possa ser lembrado. A ideia de ser um inútil
nessa vida, de não deixar nada perturba o personagem interpretado
por Jack Nicholson.
Eu tenho muita coisa que queria
ter feito e ainda não fiz. Mas também já fiz muita coisa. E acho
que estou apenas começando. Até aqui foi treino. Mas, se deixasse a
vida hoje, estaria realizado. Já deixei meu legado, já marquei
presença neste mundo. De diversas formas. Não que esteja disposto a
parar. Agora é que quero começar, com a experiência acumulada.
Espero que a balança, daqui pra frente, penda mais para o lado dos
acertos e eu possa comemorar mais, aproveitando o aprendizado obtido
a alto custo até aqui.
A vida começa aos 40.
E o que aconteceu até aqui, o
que foi então?
Treino. Preparo.
E aqui estou, pronto pra começar.
Ou quase.
Falta um pouco para terminar de
crescer o bico, as penas, as garras de novo.
E daí, com a carga de
experiência, com vida acumulada nestes anos todos, começar a vida.
Quem foi que disse que a vida
começa aos 40? Não sei quem disse isso primeiro.
Mas parece que é verdade.